A filosofia do Big Bang


por Guilherme Franzmann

(Neste texto, utilizaremos o termo Big Bang como referência ao início do Universo, ainda que esse termo tenha um significado mais preciso e diferenciado em cosmologia, que será tratado em outro texto futuro.)

Dada a imensidão do universo, sabemos que ainda há muito para ser descoberto e explorado. No entanto, nosso caminho até aqui já nos trouxe muitas descobertas e insights. Grande parte desse conhecimento tem aplicação direta e prática às nossas vidas, enquanto outra parte traz luz ao lugar que ocupamos no cosmos.

Veja, por exemplo, que através do nosso entendimento da teoria da evolução hoje somos capazes de perceber que nossos sentidos sensoriais, intuição e capacidade intelectual, em vez de servir a um propósito metafísico, são, na verdade, apenas diretas consequências de um processo natural de adaptação ao longo de bilhões de anos. No entanto, tal processo foi concebido dentro de certos limites, desde locais como clima, vegetação, etc, e também globais como escalas espaciais e temporais fixas. Portanto, tais características são naturalmente vinculadas e melhor adaptadas para esses regimes.

No que diz respeito a nossa espécie, acabamos restritos e adaptados aos fenômenos terrestres diários, de um modo geral. E esse conjunto de fenômenos parece seguir uma regra simples de causa e efeito: cada fenômeno experimentado é causa e efeito, pois é efeito de outros que o precedem e, juntamente com outros, causa de ainda mais fenômenos. É claro que essa sucessão e progressão infinitas não deixam de ser meras abstrações do ponto de vista humano, pois seja a nível individual ou de espécie, nosso tempo de existência aqui é finito.

Logo, pergunto-lhes: ignorando o que havia antes da nossa espécie, qual razão haveria para sermos adaptados para algo que fosse além da ideia de causa e efeito? Sendo assim, parece que inevitavelmente evoluímos no sentido da maximização do nosso entendimento intuitivo e intelectual ao observarmos tais relações entre diferentes fenômenos. Desta maneira, não fica difícil imaginar o porquê de tamanha confusão referente aos fenômenos de natureza quântica, os quais são inerentemente probabilísticos.

Bom, uma vez que tenhamos percebido a condição acima, finalmente podemos considerar a filosofia do Big Bang.

Imagine que voltemos ao passado distante, bem distante! E vamos considerar dois cenários:

i) um universo com um tempo inicial, com um início e

ii) um universo eterno.

Para o primeiro caso, diríamos que em um tempo convencionado t = 0, o universo passaria a existir. O que havia antes? Bem, isso não importa. Pior que isso, sequer faz sentido essa pergunta nesse caso! Acontece que o universo é, por definição, tudo que foi, é e ainda será. Então, a ideia de causa e efeito deixa de existir para esse momento inicial. E, infelizmente, acabamos presos na nossa cognição que foi adaptada para entender, seja intuitivamente ou intelectualmente, situações onde há, de fato, uma noção de causa e efeito. Portanto, se de alguma forma constatássemos que o universo teve um início, esse fato, assim como a mecânica quântica, por exemplo, desafiaria eternamente nossa intuição.

Por outro lado, tampouco o segundo cenário seria animador. Pessoalmente, acho que é ainda mais frustrante! O problema está que eternidade implica existência de uma quantidade infinita de tempo. Perceba que ao menos o cenário i) acontece com certa frequência em nossas vidas, pois é comum desconhecermos as causas de certas efeitos, ainda que elas existam. Já infinito é uma mera abstração matemática. Portanto, mesmo que um dia chegássemos a conclusão que o universo sempre existiu, tal fato seria um constante desafio ao nosso conforto intelectual.

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…aprisionados aos nossos sentidos, traídos pela natureza!

Afinal, há uma diferença subjetiva entre saber algo como um fato e intuir a respeito. E nós podemos perceber juntos que ainda que não tenhamos a resposta final sobre o início/existência do universo, dentro dessa binaridade aqui proposta podemos dizer que talvez nunca tenhamos este conhecimento desprovido de estranheza. No fim, somos todos aprisionados aos nossos sentidos, traídos pela natureza.

Portanto, refletirmos acerca do entendimento do início do universo acaba sendo uma lição de humildade. Não só percebemos que existem questões que possivelmente continuarão a nos desafiar, mas também nos serve como um lembrete da impossibilidade de se conceber uma compreensão mais intuitiva de fenômenos tão distantes da realidade a qual um primata se adaptou…

 


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6 respostas

  1. a única certeza e de que nunca vamos entender tudo ,mas o pouco que entendemos já é muito .

  2. Carlos Alipio disse:

    O nosso universo não pode ser infinito para trás pois nunca o tempo iria começar a rodar para frente, nunca teríamos o tempo positivo.

  1. 4 de agosto de 2016

    […] [1] Leia mais em A Filosofia do Big Bang. […]

  2. 12 de outubro de 2016

    […] textos agora explorando a teoria atualmente mais aceita para o que teria acontecido logo após o “surgimento do universo”: a Teoria Inflacionária. Em linhas gerais, ela propõe que o universo passou por uma expansão […]

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