Macacos Que Somos

Quem é a favor do aborto?


Essa discussão, tremendamente atrasada por desinformação e mistificações baratas, precisa ir muito além da superfície – e isso é um dever moral de qualquer um que se proponha a “discutir o aborto”, qual seja “o seu lado”…

Você é a favor ou contra o aborto?

Qualquer que seja sua resposta, parabéns! Se você respondeu qualquer coisa, acabou de cair numa armadilha sem perceber! A questão não é de respostas certas, mas de uma pergunta totalmente errada; ela é uma colocação viciada cuja resposta aprofunda o vício: coloca o próprio ato de abortar sob aprovação ou reprovação de todo e qualquer cidadão, como se fosse esse o verdadeiro afetado pela discussão e esta a inteira e unicamente a maneira de se abordar o tema. Não, não é! Os movimentos sociais engajados na discussão do aborto frequentemente buscam mostrar que suas preocupações estão na descriminalização e nas garantias de alguns direitos básicos que permitiriam acesso e controle mais seguros sobre esse procedimento.

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Afinal, este é um problema seríssimo, com implicações que vão muito além dos problemas e riscos clínicos do aborto por si só: milhares de mulheres, impossibilitadas pela lei de ter atendimento médico nestes casos, buscam qualquer modo de realizar seus abortos – e com isso se submetem à possibilidade de contrair e morrer de infecções banais, de perder a capacidade de ter filhos para sempre, de ser vítima de estelionato ou ser extorquida… por outro lado a mulher é forçada a considerar, se quiser evitar tudo isso, a ter de conviver com uma criança indesejada ou sem condições de provê-la, por vezes com intensa estigmatização social, talvez uma situação familiar de vulnerabilidade.

Esta é uma realidade que não muda com a simples propagação de um discurso conservador, como se tenta fazer. Apenas com a devida atenção médica e psicológica é possível que o aborto deixe de figurar como um índice flagrante do acúmulo progressivo de desvantagens entre classes socioeconômicas desiguais, como tem sido. Sem sequer entender o que realmente está em jogo, posicionar-se contra esta decisão implica um erro de concepção muito grave, cujas consequências aprofundam os números lamentáveis e concretos da tragédia social que nos abate pela epidemia de abortos clandestinos.

Pitty foi alvo de uma sacada “jenial” de um opositor ao feminismo e “ao aborto”. Peças como esta podem ser respondidas às vezes com um humor igualmente estúpido na essência, mas preciso no sarcasmo, que faz com que a “denúncia” de “paradoxo aparente” vire atestado de ignorância do denunciante.

Além de viciada, a pergunta inicial é viciosa: é a partir dessa formulação que a maioria absoluta das discussões sobre aborto se desenvolvem. E aí falamos de duas frentes: uma pessoal, outra social. Na pessoal, sem que percebamos, tornamos “ser a favor” ou “ser contra o aborto” uma questão de predileção individual, o que rapidamente se organiza em discursos coletivos de um “Fla x Flu” que desconsidera o lado da mulher, a verdadeira dona do direito sobre o qual todos interferem nessa discussão. Do lado social, repetimos esta pergunta tantas vezes, e tão indiscriminadamente, que a sedimentamos no nosso subconsciente, tornando-a um “gatilho ideológico”: nem ouvimos bem a pergunta, sequer reparamos nela, na sua real intenção, e quase todos nós respondemos sem pestanejar se somos a favor ou contra.

“Você é a favor ou contra o direito ao aborto?”
Não é preciso ser de um lado ou de outro para perceber que esta é a pergunta correta para lidar com a questão do aborto! E sempre que sua versão mais curta e intuitiva fosse posta, deveríamos corrigi-la, pelo bem da melhor discussão. É a partir desta, de seu aprofundamento e de suas respostas que se desdobram os aspectos em que tanto um lado quanto o outro têm tanto a dizer, com mais ou menos razão, em vez de apenas arranhar a superfície, como sempre voltamos a fazer. Muito provavelmente nem eu nem você conhecemos ninguém realmente “a favor do aborto” – mas com a persistência da confusão entre o direito e o ato, os lados se encastelam na sua posição fundamental e pouco ou nada se avança, ainda que famílias já consolidadas sofram e até sejam desfeitas todo dia com a perda da saúde ou de alguém de seu convívio.

Pouco se fala também dos “abortos sociais” que paradoxalmente se dão após a criança nascer: esta deveria ser uma preocupação irrevogável para qualquer um que discutisse sobre a questão do aborto” – ato e direito. Como diziam Caetano Veloso e Gilberto Gil em “Haiti”: há muita gente que “vê tanto espírito no feto e nenhum no marginal”

Enquanto permanecermos neste atoleiro de concepções, que achata e impede o desenvolvimento do diálogo necessário e já há muito atrasado, nós brasileiros permaneceremos estancados. E o que não vai se estancar por si só é a perda evitável de muitas vidas já feitas, de mães, esposas e filhas jovens ceifadas pela ignorância coletiva; nem tampouco e a miséria de infâncias por vir atiradas sob o estigma social, sob o peso das desigualdades socioeconômicas e regionais, dos fundamentalismos morais e religiosos, capitalizados sobre o intuitivismo e o senso comum. Qualquer posição tomada à revelia de tudo ou da maior parte das questões que envolvem o aborto é um ato de puro cinismo, egocêntrico e intransigente. Não toma em conta os efeitos efetivos e concretos pelos quais outras pessoas passam, favorecendo apenas as próprias abstrações prediletas.

Posicionar-se contra esse idealismo perverso que se retroalimenta de nossa passividade e ingenuidade é a atitude que deveria ser considerada “pró-vidas” – e assim mesmo, no plural. E isto independe de lado!


Este texto, como os das demais colunas opinativas do portal, é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente o ponto de vista dos demais colunistas ou do papodeprimata.com.br.


Sávio Mota

Cearense de cabeça pontuda, dizem que é jornalista e rebento da tal geração Y. Cético desde sempre e corinthiano desde que é gente, gosta de ciências e futebol, cinema e documentários de tevê - além de ser apaixonado por História e por Evolução. É CODA. Tem um pequeno canal no Youtube, "O Mundo Paralelo de Neander". Wanna be a scientist. Normal não é.

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79 respostas

  1. ”Métodos anti-concepcionais estão aí”

    Como se nunca pudessem falhar, mesmo se utilizando deles. Esse é um ”argumento” muito mal pensado. De fato, há de se ter um certo ”limite” em relação ao período da gestação para que possa ser feito o aborto. Se for mostrado que antes de data x, o feto não sente absolutamente nada, ninguém tem o direito de se meter nisso. O problema é o gigantesco tabu em relação a esse assunto, e geralmente as pessoas se baseiam em seus conceitos religiosos para ”fundamentar” seus ”argumentos”. É como eu me basear nos gibis da Mônica pra falar sobre crianças.

  2. EU TIVE O DIREITO DE NASCER, PORTANTO, SOU VEEMENTEMENTE CONTRA!

  3. A favor, dependendo da situacão.

  4. Alex Cambraia Alex Cambraia disse:

    A situação não é tão simples assim para dizer “Sim” ou “Não”.
    Cada caso é um caso. Tem que se avaliar motivo, condição (familiar, econômica, social), causa, tempo de gestação, método do aborto, idade da gestante, etc.

  5. Sou contra. Mas a mulher deve ter o direito de escolha (até determinada semana de gestação).

    • Savio Mota Savio Mota disse:

      Sou pssoalmente contra o aborto tardio, acho profundamente lamentável, mas ainda assim é um direito da mulher. Deveria ser considerado assim, plenamente dela, enquanto a criança estiver lá dentro.

  6. Alan Ferreira Alan Ferreira disse:

    Contra o aborto, mas a favor de políticas que propiciem segurança pra quem resolver optar pelo procedimento. Detalhe, que eu seja contra ou a favor, não muda muita coisa. Sou homem e acho que esse direito/fardo recai muito mais sobre a mulher.

  7. Difícil eu me posicionar num tema tão polêmico como o aborto, tenho pouquíssimo conhecimento sobre, mas no meu ponto de vista superficial sou a favor em casos de estupro ou doenças fatais.

  8. Sou a favor do planejamento familiar

  9. Eu sou a favor do aborto.

  10. Se as pessoas forem a favor do planejamento familiar, esse debate ficará obsoleto pois o aborto só será considerado em casos de estupro, má formação do feto, etc e então acredito que caiba aos pais decidiram continuar a gestação e se decidirem pelo aborto, devem ser respeitados pelas pessoas e amparados pela lei.

  11. Patricia disse:

    Nasci, estou grávida, e continuo completa e plenamente a favor do DIREITO a um aborto seguro, pra qualquer mulher que precise e queira recorrer a um, sem necessariamente ser por conta de estupro, doença, risco de morte…

  12. A favor da gestante decidir. A vida é dela.

  13. Contra ! E acho uma tremenda desonestidade quando tentam a too momento mostrar que ciência é favorável ao aborto e religião não como se tudo se resumisse apenas a isto.

  14. Bruno Felipe Bruno Felipe disse:

    A favor, mas em determinadas situações.

  15. Val Lima Val Lima disse:

    A favor, acho que os responsáveis pela possível criança, tem o direito de decidir. Melhor do que ter e depois abandonar ou maltratar.

  16. A favor do direito da mulher de decidir

  17. Daniel Soares Daniel Soares disse:

    A favor em qualquer caso.

  18. Contra o aborto e a favor da descriminalização do aborto!

  19. Nao acho que alguem seja “A favor do aborto” . Ngm acorda numa bela manha e diz, “Pow, que vontade de realizar um aborto”.
    Sou a favor da descriminalizacao e legalizacao do aborto, tambem que o SUS ofereca atendimento a mulheres que se sentem na necessidade de realizar um aborto, tao quanto acompanhamento psicologico apos o procedimento ser realizado.

  20. Por mais que não tem relação direita com o tema eu recomendo a leitura do livro A Ralé brasileira porque mostra como nas ciências sociais a classe E ou que se pensa ser é constantemente mal interpretada.

  21. Eu acho que a pergunta está mal colocada. Deveria ser: você é contra ou a favor do direito de abortar?

  22. depende de quem e como abre as pernas.

  23. Eu particularmente jamais mataria um ser indefeso , seria covardia … Minha opinião !
    Mas em caso de estupros ou doenças terminais ou transmissíveis acredito q seria prudente por ser uma situação extremamente delicada .
    Mas já ouvi muitos universitários aqui em Caxias do sul RS , serem a favor , principalmente pessoas economicamente desfavorecidas , segundo eles são pessoas q só estão na sociedade para sugar o dinheiro dos ricos da sociedade , dizem q são câncer não são nem fetos … Achei absurdo a colocação. Mas quem sou para criticar ! Acho q existem inúmeras maneiras de se evitar ,em postos d saúde ao menos no sul do país , distribuem preservativos , anticoncepcionais o q ajudaria e muito evitar uma gravidez indesejada …
    Nas manifestações feministas , vi uma uma protestante da” marcha das vadias ” pedirem seu direito d liberdade e escolha em cometer o aborto , acredito eu q a partir do momento q se tira o direito a vida de um ser , por descuido da genitora a mesma não merece nem deveria ter a capacidade de pedir direto d liberdade ; o assunto é um tabu todavia no Brasil … É algo q se deve ser mto discutido há várias situações e circunstâncias para tal atitude .

  24. Igor Costa Igor Costa disse:

    qualquer que seja o motivo é válido, podendo ser feito somente até os 5 primeiros meses. Esse vídeo explica Maravilhosamente bem:
    https://www.youtube.com/watch?v=jpJUMSyHkKE

  25. Phelipe Alves Phelipe Alves disse:

    Bem, eu não tenho útero, penso que a opinião de um homem é a que menos importa, mas também tem que ser levada em consideração; Um casal de 15 anos terá de carregar a responsabilidade de uma vida por algo feito em uma noite ? Uma mulher deve criar um filho sozinha, fruto de uma gravidez indesejada ? E muitos outros casos por ai. SE dependesse de mim para resolver esse dilema: Quanto menos o governo se meter na vida do povo, melhor. Posto isso, digo: O aborto deveria ser permitido em TODOS os casos em que a Mulher ou o Casal julgar ser o que os mesmos queiram, seja rico ou pobre, seja um feto anencéfalo ou saudável. Não é que uma eventual legalização do aborto vá provocar uma corrida as clínicas, vai principalmente salvar a vida de mulheres que vão a verdadeiros açougues para fazer algo que é proibido mais diz respeito somente a ela.

  26. Emersom Gaty Emersom Gaty disse:

    Se homem engravidasse não falaríamos nisso!

  27. Sou a favor tendo em vista que constitui um problema de saúde pública.

  28. Contra o aborto e a favor da descriminalização!

  29. Ninguem é a favor do aborto! o que se discute é problema de saúde que se agrava por clinicas e abortos clandestinos onde milhares de mulheres morrem, por terem que se esconder. por ser considerado crime. essas mulheres não podem procurar ajuda medica e psicológica para quem sabe ate mudarem de ideia. mas como vivemos em um pais que discute o que o outro faz com seu rabo e não debate o problema em si. tudo fica mais difícil!! Com religião e ignorância = a intolerância.

  30. “O aborto deve ser livre, mas raro.” Bill Clinton

  31. Fabricio Belo Fabricio Belo disse:

    Contra… com ressalvas

  32. Fabricio Belo Fabricio Belo disse:

    Já pensou se o “abortado” pudesse responder essa questão?

  33. Moralmente contra, legalmente a favor.

  34. Leila Leiloca Leila Leiloca disse:

    Sou a favor da forma HONESTA como cada um trata seus desejos e administra suas coisas! O que cada um dos 7.3 bilhões de zumbis faz do SEU CORPO, não me diz respeito!

  35. a favor, proibir nao funciona em nada. Pois se cria um mercado do serviço ilegal, recheado de riscos. Pensando na redução de danos eh melhor que quem opte por isso que se faça num ambiente apropriado e nao com uma agulha de crochê

  36. Goncalves El Goncalves El disse:

    Eu nunca serei a favor do aborto nem da eutanásia assim como nunca serei a favor da pena de morte.
    No entanto, reconheço que há casos em que se fazem necessários para evitar maiores sofrimentos.

  37. Temos que cuidar e dar condições de vida aos que estão vivos!
    Milhares de crianças abandonadas ou jogadas a própria sorte, onde muitas morrem por inanição ou doenças no primeiro ano de vida. Mães desesperadas, sem condições de ter mais um filho, muitas não podem crias sequer um, procurando clínicas clandestinas sem a mínima condição de realizar o procedimento com segurança, outras realizando seu próprio aborto sozinhas, enclausuradas nas suas próprias casas, correndo risco de morte…
    Em quanto o Estado não de suporte a preservação da vida, é NECESSÁRIO a descriminalização e legalização do aborto SIM!
    Quem for contra, seria bom assumir e dar condições de vida a todas as crianças que nascerem em lares sem condições de ter-los… é isso ninguém quer ou tem alguém que queira?
    SOU A FAVOR SIM!

  38. Ng e a favor do aborto.sou a favor de deixar de ser tabu e crime…pro escolha,sempre.

  39. Eu acho engraçados os comentários da espécie “sou contra, mas favorável que possa ser feito”. Estivéssemos nós analisando o período escravista, o que vocês pensariam daqueles a dizer “sou contra a escravidão, mas acredito que todos devem ter o direito de agir como bem aprouverem”?

    Ademais, e aqui aventuro-me na discussão, direitos pessoais dizem respeito a uma faculdade de exigir uma ação ou omissão de outrem relativamente a você (o conceito não está juridicamente perfeito, mas o comentário não é técnico, por isso resumo e dou pouca atenção ao conceito). Afirmar que a mulher tem direito de abortar porque o corpo lhe pertence pressupõe, de forma subentendida, que o nascituro lhe pertence como integrante de seu corpo. Ora, isso é deveras absurdo. O fato de que é gerado em seu corpo não lhe torna parte dele. O fato de que algo há no seu corpo, não faz desse algo parte de seu corpo. Do contrário, lombrigas, bactérias, e todos os outros seres e coisas que porventura estejam dentro de um corpo, por força da premissa anterior, tornar-se-ão parte do corpo hospedeiro.

    Talvez alguém levante: “você está comparando um nascituro a lombrigas?”, no que direi: sim, porém, não. Enquanto um ser distinto daquele o qual tem o corpo “invadido”, diferença não há. Por outro lado, e isso é óbvio, há uma grande diferença entre seres humanos e vermes.

    Assim, a não ser que alguém defenda “basta estar dentro do meu corpo que é parte dele”, não há sustento do “meu corpo minhas regras” como justificativa para a prática. A outra possibilidade, é tratar o nascituro como que sendo não diferente de um objeto, uma coisa, o que – para pessoas sensatas – dispensa que se discorra sobre.

  40. Mary Reis Mary Reis disse:

    Eu nao sou contra e bem sou a favor. Até que não seja eu a ter que tomar decisões

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