Valor da Terra

Sobre meio ambiente e sustentabilidade


O conceito de meio ambiente vem ganhando abrangência e destaque ao longo das últimas décadas. O que comumente era definido pelas pessoas como floresta, planta e bicho (ou aquele amontoadinho de mato lá na Amazônia), agora é difundido como sinônimo de preservação: “- Ah, meio ambiente? Sei sim. Temos que protegê-lo, reciclar e ser sustentável!”.

Sustentabilidade! Essa é a palavrinha da moda. A cada dez campanhas publicitárias de grandes empresas, o pessoal do marketing dá um jeito de inseri-la em no mínimo nove. De petrolífera a madeireira, hoje em dia todo mundo é sustentável. Pronto!, com essa crítica logo no início já fica definido que essa coluna é provavelmente escrita por mais um ecochato, daqueles que sonham em derrubar o “Capitalismo Malvadão” com uma motosserra na sexta-feira 13. Certo? Hãmmm… Não!

Como diria George Carlin, o planeta não precisa ser salvo. A Terra já esta ai há mais de 4,5 bilhões de anos, e pode apostar que durante esse tempo ocorreram situações muito piores do que um punhado de gente soltando fumaça e plantando soja. “– Oba! Então tudo bem ir ali cortar umas árvores e vender dois carros para cada chinês?” Não tão rápido jovem! Para o planeta sim, tá ok. A Terra está calejada com meteoros e dinossauros, e ficará bem até se o amigo oriental do Cid resolver soltar bomba nuclear na cabeça de todo mundo. Mas para os ecossistemas, a nossa qualidade de vida e até mesmo permanência neste pálido ponto azul, teremos que analisar e planejar essas ações com um pouquinho mais de cautela.

Percebeu a palavrinha diferente na última frase? Ecossistemas! Basicamente é disso que me proponho a tratar neste espaço. E o que seria mesmo esse negócio? Bom, de forma bem simplista, ecossistema é a interação dos componentes bióticos e abióticos em um determinado espaço. Em outras palavras, é tudo! Com certeza você já ouviu falar na famigerada “Teoria de Sistemas” que permeia praticamente todas as áreas do conhecimento (embora tenha uma aplicação diferente aqui, um modelo distinto acolá). Bem, a ideia consiste em entrada de energia e transformação desta até onde o ponto que der pra levar. É um conceito relativamente simples, que serve para explicar tanto o funcionamento de um motor de carro quanto do nosso corpo.

O fato é que somos totalmente dependentes dos ecossistemas e dos serviços que eles nos fornecem. Isso engloba o ar, a água, alimentos, controle de doenças, regulação do clima, satisfação espiritual, apreciação estética e o mais importante: Wi-Fi disponível. Qualquer alteração nessas interações e na ciclagem natural dos serviços ecossistêmicos, pode resultar em problemas graves. Por exemplo, só não temos mais vídeos do “Desafio do Gelo” no Youtube, porque os paulistas estão momentaneamente impossibilitados de participar (“– Ah o ciclo da água…”). Entendida esta parte, será fácil a compreensão de que algumas pessoas que estudam e trabalham com meio ambiente, não procuram escrever em blogs apenas com o intuito de pedir aos seus leitores que abracem uma árvore, se tornem veganos, adotem um gatinho e assinem uma petição online do Greenpeace.

Ao longo das últimas cinco décadas, a zoeira não teve limites na corrida do desenvolvimento. Só que “Mamãe Natureza” não tem achado tanta graça assim, e ao perceber isso, alguns grupos procuraram tomar certas providências antes que fôssemos expulsos de casa. De resultado podemos citar o Protocolo de Kyoto; Rio 92; Economia Verde; Crédito de Carbono e etc… Tá ligado naqueles papeis com um tanto de metas bonitinhas que os EUA não gostam de assinar? Pois então: algumas pessoas chegam a afirmar que a OPEP (Clube dos Badass do Hidrocarboneto) fez muito mais pelo Meio Ambiente ao elevar o preço do barril de petróleo acima de dois sacos de pitomba, do que todas as reuniões da Cúpula da Terra. Uma coisa é inegável, o preço do Petróleo fez todo mundo se virar nos trinta de alguma forma. No caso do Brasil, como não tínhamos o poder bélico dos países da OTAN ou o Rambo disponível para fazer um acordo “amigável” com os Sheiks, desenvolvemos o nosso próprio combustível a partir da cana de açúcar, o Etanol (qual outro país você acha que inventaria o motor movido à cachaça? Aqui é BR!).
Aqui chegamos ao ponto crucial para esclarecer ou propor uma definição melhor de sustentabilidade. A historinha da OPEP não foi citada à toa; serve para demonstrar qual é a linguagem universal que vêm sendo adotada pelos gestores (espertos) do meio ambiente. O inglês? Petróleo? Hum… Cachaça?!!! Não! PREÇO! Se a matemática é a linguagem do Universo, o sotaque da Terra é um cifrão! Na década de 70, o petróleo não estava acabando (só por curiosidade, atualmente a prospecção de novas reservas cresce acima da taxa de consumo), mas pagar 10 vezes mais pelo mesmo produto em um prazo de 2 ou 3 anos, fez com que a busca por outras fontes alternativas de energia se tornasse viável.

sustainability-and-stock-prices-copy-300x266Falando mais uma vez da escassez de água em São Paulo. Imagine a seguinte situação hipotética: você é um especialista ambiental e observa que uma determinada área será desmatada para pastagem. O impasse é que ela fica bem próxima a uma nascente que precisa ser preservada. Caso contrário, isso irá causar uma alteração no microclima daquela região, gerando um desequilíbrio no ciclo de precipitação e posteriormente na retenção de água, prejudicando de forma irreversível o fluxo de um rio, que por acaso abastece uma represa. O que você faria com essa informação?

A) Criaria um abaixo assinado no Avaaz.

B) Faria um discurso emotivo na Câmera Legislativa.

C) Denunciaria o ruralista na Band.

Não aconselho nenhuma das alternativas acima, já que historicamente elas não fazem muito sucesso. O correto seria apresentar os “cifrões”. Assim que a conta bilionária de uma cidade desabastecida chegasse à mesa do Governador, com certeza alguém teria que ir até o fazendeiro pagar alguma indenização para ele ir pastar bem longe e fim de papo. Todos viveriam felizes para sempre. Eu sei, obviamente o mundo e principalmente as relações políticas não são tão simples assim. Mas acredito que tenha ficado clara a ideia de que uma das diretrizes na preservação do meio ambiente, se baliza em mensurar valores aos serviços ecossistêmicos.

Isso é: para que a Amazônia não seja terraplanada em pasto, com o espetinho chinês evoluindo de grilo para picanha, a floresta em pé tem que valer mais do que as ações da Friboi!

Então a definição prometida de sustentabilidade, passa a ser um tripé econômico, social e ambiental. Se a ideia não é economicamente viável, não adianta a boa intenção, o mercado não irá permitir que ela funcione. Se ela prejudica comunidades, gera desemprego e etc., ela tem que ser repensada!

Nos próximos posts, as temáticas e os problemas abordados serão mais específicos, contando sempre com a visão holística de valoração dos serviços ecossistêmicos por meio do tripé da sustentabilidade, tendo o desenvolvimento científico e tecnológico como os grandes aliados nesta batalha colossal que é tentar manter o equilíbrio complexo entre os ecossistemas e as modificações antrópicas que promovemos.

Entendemos que meio ambiente já não está mais restrito à chácara no fim de semana e deixando de ser o “amontoadinho de mato lá na Amazônia”, para ser tudo que estiver ao nosso redor onde quer que estejamos. Sendo assim, a responsabilidade sobre o meio ambiente torna-se de todos, pois nossas ações sempre interagem interligadas ao grande ecossistema que chamamos de Planeta Terra!


Este texto, como os das demais colunas opinativas do portal, é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente o ponto de vista dos demais colunistas ou do papodeprimata.com.br.


André Gomes

Fã de Homem-Aranha, Sagan, Hitchens e Yuyu-Hakusho, é considerado por ele mesmo o melhor guitarrista do seu quarto (há controvérsias). De tanto ser chamado de “fiscal da natureza”, decidiu cursar Gestão Ambiental na UNB, e agora, diferentemente dos seus heróis da infância, pretende cobrar para salvar o mundo. Sempre disposto a debater sobre política, futebol e religião (só para contrariar o ditado popular), aprendeu que Teoria é diferente de teoria, que não é nada menos do que poeira das estrelas e que a resposta é 42.

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3 respostas

  1. Ciro Rockert disse:

    Bem-vindo, primata! Ótimo ler um texto claro, bem humorado e com senso crítico, racional e desprovido de paixão, seja pelo lado “salve a natureza” quanto pelo “não parem o progresso”. Gostei do título “Valor da Terra”. Que venham mais textos! P.S: Seria legal citar ao final do artigo indicações de bons livros sobre o tema ou aqueles em que se baseou. Grande abraço ao autor!

    • André Gomes disse:

      Obrigado! Que bom tenha gostado. Sua sugestão está devidamente anotada. Haverá sim, referências e algumas indicações já no próximo texto.

  1. 1 de setembro de 2014

    […] Postagem anterior Sobre meio ambiente e sustentabilidade […]

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