Humanismo

A ética e a igualdade


Num trabalho que envolva a ética em sua forma prática, é possível que encontremos uma quantidade grande de situações que serão discutidas em suas nuances, onde muito se poderá interpretar como uma forma de inversão de ideias para a manutenção ou mesmo a extirpação de um paradigma. Uma destas é a ideia da igualdade. O que podemos projetar com relação sobre o que se deve ter como noção de igualdade entre as pessoas pode não condizer com o que o consenso nos tem mostrado, com o que a prática de algumas situações tem sido feitas ou mesmo algumas leis e diretrizes que tem sido tomadas.

Todas as pessoas possuem o que poderíamos chamar de direitos morais, onde à elas seria intrínseca sua participação em sociedade. A separação por um determinado grau que envolva etnia, gênero, proveniência, deficiência, dentre outros envolvem fatores que seriam específicos aos ditames daquilo que é referido ao que se faz, suas vontades e suas necessidades. Mas, de qualquer forma, isto não acaba por ser uma argumentação sustentadora de quaisquer segregações que estejam sendo feitas. Mas apenas a posse da personalidade moral não é o suficiente para o princípio de que todas as pessoas são iguais. Parte-se que as pessoas não são iguais. Existem as diferenciações básicas e natas. Pesquisas das mais diversas variações conseguiram demonstrar – mesmo que a título de um início de um pensamento – que a própria variação genética entre pessoas e entre tipos diferente de seres humanos acabam por dar traços que os fazem aptos a determinadas situações, enquanto outros o fazem em outras áreas.

Muitos deste dados utilizados podem levar a concepções segregacionistas, mas que estas concepções apenas deixam de analisar mais parcimoniosamente os dados que lhes são apresentados. Um exemplo disto é que foi observado a predileção inata masculina em atividades que necessitem da aptidão em cálculos matemáticos e orientação visual-espacial, enquanto que as mulheres possuem mais facilidade na compreensão de textos complexos e verbalização. Mas isto, mesmo sendo inato, não compreende o indivíduo e todos os aspectos que o cercam, mas mais voltado para uma generalização de grupos e alguma características, e os próprios números não mostram uma diferenciação gigantesca que referendasse motivos de separação e classificação. Mas o que vemos é que existe um número estimado de cinquenta por cento dos homens acabam por possuir as aptidões necessárias para se ser engenheiro e arquiteto, por exemplo, enquanto que as mulheres teriam cerca de vinte e cinco por cento disto. Mas quando vemos os números de pessoas atuantes nestas áreas vemos uma discrepância que em muito foge à razão que poderia ser apresentada pelo fator biológico, como um número cerca de dez vezes maiores na mesma direção, e em alguns lugares até maior. Com isto às vistas, fica claro a argumentação de que mesmo com fatores biológicos, o que acaba por determinar a inserção da mulher em seu “papel social” é a parca oportunidade para elas nestas áreas.

A tendência biológica à superioridade visual-espacial masculina constitui, na realidade, uma maior presteza natural em aprender essas especialidades. Quando as mulheres são criadas para serem independentes, sua aptidão visual-espacial é muito do que quando ficam em casa e dependem dos homens. (…) Portanto as feministas podem estar certas ao atacarem o modo como incentivamos meninas e meninos a tomarem rumos diversos em seu desenvolvimento (…). (SINGER, 1998)

Ethics

Outro aspecto discriminatório e que é o mais comum, sendo muitas vezes posto como o mais justo para se dizer quem deve ter as melhores oportunidades e o crescimento pessoal é a inteligência, mas neste caso o aspecto é muito mais limitado em função de existir como classificador o teste de Q.I. Medir a inteligência de alguém denota vários parâmetros que raramente são contabilizados, e isto cria aspectos a se julgar esta ou aquela etnia, este ou aquele gênero – e assim, por diante – como mais aptos para se galgar um patamar maior. Mesmo que todas as crianças passassem a serem educadas de forma tão linear a ponto de a educação ser exatamente igualem todas as instâncias sociais e geográficas, inexoravelmente haveria o aspecto genético, que influenciaria e muito nesta educação. Tendo em vista todo os aspectos, que compreensivelmente são extremamente difíceis de enumerar e portanto arruma-los, todo indivíduo passa pela situação de se ver inserido em sociedades que possuem suas diferenciações e suas dificuldades, tendendo à este ser muito específico em sua capacidade de aprendizado, igualdade de oportunidade acaba por não ser a mesma coisa que dar oportunidades a todos. Acaba-se por recompensar quem tem a sorte de nascer em determinado ambiente, com determinada genética e isto foge em muito ao escopo da igualdade. A base da igualdade está na igual consideração dos interesses do indivíduo, das necessidades que este possui a serem sanadas.

Uma das justificativas do uso do Q.I. para fomentar a elevação do patamar classicista de poder e status é que se paga mais para quem se dedique a uma determinada área e que esta seria de necessidade grande para a sociedade, e que contrário fosse não haveriam profissionais para isto caso salários e ganhos fossem equiparados. Não existe prova alguma que corrobore esta ideia, e pessoas buscam aquilo que suas aptidões demonstram, de maneira geral. A alegação que o esforço para estudo e dispêndio contariam para o enriquecer de sua classe justificaria os altos ganhos também não podem ser válidos, pois estes mesmos não estão equiparados. O próprio ensinar acaba por se personificar em este ser melhor que aquele. Todos comparados em suas próprias dificuldades e com recursos parecidos, dificilmente haveria um motivo para a distinção de ganhos Se não há motivo para um, não há por que haver motivos para o outro.

Neste aspecto, há quem diga com verdade que ações afirmativas (aquelas em que se “trocaria” o lado do oprimido, do marginalizado) discorreria da mesma atitude equivocada de discriminação, com ações como cotas, bolsas e demais fatores a recolocar determinado grupo subjugado numa situação em que ele possa ter de fato as mesmas oportunidades. Mas isto está equivocado pelo fato de o que há é uma aplicação de uma justiça social, e aplicações assim decorrem exatamente como uma forma – ainda inicial – de se corrigir os desmandos que por séculos permearam nossa cultura e que tanto fizeram com que os grupos oprimidos tivessem, hoje, suas chances drasticamente reduzidas. E tanto quanto isto, os próprios modelos que se apresentam para a separação do que um ou outro tem mais ou menos aptidão não são suficientemente conclusivos para se adotar o que este ou aquele deve fazer para ser o melhor num concurso, prova ou classificação. Os critérios em geral adotados passam pelo exame da inteligência e, como já demonstrados, subvertem a real noção de igualdade. Uma universidade que queira adotar normas de cotas não está, portanto, segregando mas adotando outro critério, uma vez que o próprio critério original de prova é subjetivo e não contundente.

Mas o que podemos ter então é que a igualdade independe dos aspectos que formam o ser humano em toda sua complexidade, mas são muito mais voltados para as necessidades de satisfazer-se enquanto necessidades próprias. Não importa o quão inteligente alguém seja em comparação a outro, ou sua força física, sua destreza em determinado aspecto, mas sim o fato de, como ser humano, ele ter seu direito à igualdade social e moral.


Este texto, como os das demais colunas opinativas do portal, é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente o ponto de vista dos demais colunistas ou do papodeprimata.com.br.


Henrique Dal Bo Campanilli

Henrique é poeta, colunista, aprendiz de cachaceiro e de gaita; torce pela humanidade, apesar desta muitas vezes não lhe dar motivos para tal.

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